John Frusciante postou um texto sobre criatividade em seu blog no dia 16 de janeiro. Confira o texto traduzido abaixo.
Tradução: Felipe Marcarini
A frase "The Will to Death" (desejo de morrer) se refere à subjacente e predominante inintencional organização em trabalhos por artistas que amam e são devotos da força criativa, mas odeiam o que enxergam da força da vida e suas maneiras. É um conjunto de princípios abstratos que podem ser aplicados no ato criativo. No simbolismo artístico, uma pessoa chega perto da morte e ela não apenas não morre, mas também vive mais intensamente por ter passado por essa experiência. Isso pode ser entendido como um conjunto de fórmulas musicais/matemáticas que o artista usa sem saber.
A força criativa é um produto da força da vida, mas nosso julgamento da força da vida é baseado em nossas percepções de seus efeitos, sua superfície, tudo que acontece no mundo externo que conhecemos. O mais perto que chegamos de ver a essência da força da vida é em nossa percepção da força criativa. Em trabalhos artísticos, a força criativa fornece adição e multiplicação. A força criativa é mantida pela inteligência humana através da nossa devoção pela divisão e pela negação e também, simbolicamente, do ponto de vista da inteligência humana, é um esforço para a morte. A ação criativa racional pode ser uma coisa enriquecedora e cheia de vida, pois nosso pensamento criativo é negação apenas na superfície dos pensamentos, a essência dos pensamentos é idêntica aos desejos da essência da força da vida.
Então, em "The Will to Death" uma pessoa se esforça para a morte, mas é indiretamente apoiada pela força da vida, e assim os desejos dos artistas são sempre algo que nunca se alcança, para a força criativa defender os aspectos da força da vida que o ser humano não enxerga. E assim, devido a sentimentos e visões interiores, as divisões mentais e subtrações que um artista deve ser fluente em levá-lo por um caminho são apenas subtrativas em sua relação com suas ferramentas, enquanto a força criativa leva a substância aditiva da força de vida que é finalmente percebida.
Subtração e negação são sempre uma questão de graus, além de que é o desconhecido positivo, a essência da força da vida. O aparelho principal perceptivo do artista é adequadamente cego para os aspectos positivos por atrás da negação, mas ele sente-os e é frequentemente mostrado interiormente a eles. Mas, assim como as pessoas e suas fixações à imagem e aparência, ele não pode agarrar o positivo invisível e desconhecido, então ele se apega à suas negações, subconscientemente sabendo que eles estão ligados à força da vida, mas conscientemente só conhecendo a força da vida pelo mundo e sua maneiras, sendo assim sua única imagem dela para trabalhar. Se não fosse o significado aparentemente inexplicável inerente ao seu trabalho, ele não se esforçaria por um caminho de negação e de divisão. É o conhecimento subconsciente que é realmente um caminho ascendente que alimenta-o a continuar a esforçar-se no sentido de uma maior compreensão dos aspectos negativos que a maioria das pessoas parecem simbolizar como o temido desconhecido, inútil para dissecar. Em outras palavras, o artista se esforça para a morte, porque, para ele, aquilo é como a vida. E quando ele apresenta o seu trabalho para os outros, aquilo parece a vida para eles, enquanto, na verdade, a negação e morte que estão abaixo da superfície. E, claro, além desse superfície, como eu acabei de explicar, está a força da vida, mais uma vez.
Se um artista está aplicando "o desejo de morrer", ele tem os seguintes três posições em equilíbrio. Ele está no meio, ocupado com a negação e separação. Em sua frente está a expressão da vida, visível e audível para ele e para os outros, e por trás está a força criativa, visível e audível apenas para ele. Por trás está a força da vida, em que ele não pode ver nada mais do que seus espectadores podem ver suas negações mentais, ou a personificação da força criativa que é talvez conhecida para ele.
Três condições precisam estar balanceadas para o artista aplicar o "desejo de morrer":
1) Confiança e devoção à parte do ato criativo que ele não pode controlar. Ele deve possuir uma concepção da diferença entre a força criativa e ele mesmo, em grande medida, de modo a ser controlado por ele. Isto significa uma espécie de desapego de várias partes de si que compartilham algo em comum com a força criativa, ou seja, o desejo de manter um movimento contínuo para frente. Esse movimento vem se alguém confia na força criativa. Nenhum de nós pode causar isso mais do que podemos causar o movimento contínuo do tempo. Para participar disso, tudo está em nosso poder, e fazer isso é um grande privilégio. Se alguem tem amor pela arte, é ótimo o suficiente, sua apreciação por sua chance de participar do ato criativo é ótimo o suficiente, então confiar na energia que os guia vem naturalmente. Se o artista tem uma personificação interna deste aspecto da força, então é isso que ele ama e confia, mas ele ainda deve amar e confiar quando não há imagem, mas apenas um sentimento não-específico, não definido, forte e sensível de uma força falante de energia. E esta confiança no que equivale aos próprios sentimentos da pessoa deve ser maior do que a confiança dela nas coisas que as pessoas geralmente confiam, como um consenso geral, pontos de vista popularmente aceitos, comumente aderidos a limitações ou restrições e convenções atuais.
2) A capacidade de mentalmente perder-se em um fascínio com negações e divisões. Essencial para o processo criativo são contradições, separar as coisas, esculpir coisas, e desconectar isso daquilo. O mais importante é a contradição da força que guia a pessoa, seu amor por esta força ser tão grande que a contradição não pode ajudar, mas levar a um novo acordo. Ela deve estar indo em uma direção e depois mudar para uma nova direção, sem perder o seu caminho. Se a condição 1 está em ordem, ela não precisa ter medo de mudar. O papel do artista é sempre procurar novas maneiras de ir, apesar de não ser o único motorista.
3) O terceiro é a sua criação da aparência das condições 1 e 2 como ser um movimento singular, e não uma infinidade de direções contrárias. Isto implica que as condições 1 e 2 são tão equilibradas que há uma perfeição da forma em todos os contramovimentos contidos nisso. Toda oposição logo descobre sua coordenada. Cada fim se sente como um novo começo. Cada repetição se sente como um fluxo contínuo. Toda negação aparece como positividade e cada perda aparece como um ganho. Não pode haver diferença entre sensação e aparência para o artista, elas devem ser uma coisa só. É este ponto que é salientado pela corrente de força da vida. A força da vida está longe, pertencente a essência das artes, e também está perto, pertencente à percepção da soma de todas as coisas que compõem a aparência de uma obra. Estes são os lados. O artista vê três partes: o que a força criativa traz e perpetua, o que o próprio artista retorce, revira e neutraliza, e a soma do que o artista percebe. E é lá que o envolvimento dos artistas com suas obras deve terminar, se o "o desejo de morrer" está para ser aplicado. Caso contrário, o artista está comprometendo a condição 1, e em qualquer grau que ele faça isso, o equilíbrio necessário para a aplicação do "desejo de morrer" é jogado fora. O artista fica no meio dos dois lados. O que está além deles não é de nenhum interesse para ele. Ele nunca vai perceber diretamente a força da vida, e nem quer. Ele não pode ouvir com ouvidos de outras pessoas, ou ver com os olhos deles, e sacrifica o benefício de seus próprios sentidos em qualquer grau em que ele tenta fazer aquilo. A força criativa está levando o artista em um carro. O artista que tenta assumir o volante vai encontrar "o desejo de morrer" indisponível para ele, como ele mesmo se fez indisponível para isso. Seres humanos localizados em um único ponto no momento é a razão de nós ouvirmos e vermos como fizemos, e é isso que faz a arte e sua percepção possível em primeiro lugar. Nosso escopo limitado de visão é um presente, permitindo-nos ver da esquerda para a direita, de cima para baixo, de positivo para negativo e assim por diante. Porque cada um de nós possui uma perspectiva singular, podemos confiar no que vemos e sentimos. Podemos contradizer a nós mesmos e estarmos certos várias vezes.
Assim, para resumir, deve-se permitir ser controlado pelo, ainda contrariamente, o que controla as pessoas, de forma que o "momentum" e o design básico fornecido pelo controlador continua, enquanto a vontade e a individualidade do artista persistem. A força criativa é metade essência da força da vida e metade correlativa do artista e de todas suas negatividades essenciais. No "desejo de morrer", o ato criativo é uma amigável discussão entre a força criativa e o artista. É o mesmo que dois amigos próximos discutindo sobre boxe. Assim como os dois amigos têm um certo conhecimento em comum, que fornece a base para a discussão, a capacidade dos artistas de navegar por negações e divisões, alinha-os com a força criativa e suas adições e multiplicações, até o ponto em que a discussão é, na verdade, uma afirmação que os conecta.
A força da vida está principalmente ligada com os efeitos da energia comunicativa, e a força criativa está principalmente ligada ao aumento da qualidade da arte, e possuem uma perpétua discussão amigável sobre esses pontos e as vidas e obras de entertainers e artistas, e as várias combinações dos dois são os assuntos. Na superfície, parece que a força da vida sempre vence a discussão com a força criativa e a força criativa sempre vence a discussão com os artistas. Mas, enquanto a força da vida criava a força criativa, a força criativa por sua vez, criou a percepção humana da força da vida. E a força criativa cria os artistas, mas a mera existência dos seres humanos cria um espaço para a força criativa viver em conjunto. Isto significa que o perdedor aparente é sempre também o vencedor, como a força da vida, a força criativa, artista e público são essencialmente uma coisa só, assim uma discussão de boxe resulta na afirmação de que cada amigo tem seu próprio cara, enquanto o esporte em si conecta suas diferenças . Isso tudo foi feito aos poucos para que os verdadeiros desejos da força da vida sejam vividos, por necessidade, pelas unidades negativas de si mesmo, o que gradualmente resulta nas intenções ocultas da força da vida se tornando visíveis. O propósito das força criativa envolve os aspectos mais elevados da força da vida emergindo vitoriosos sobre os aspectos inferiores, e o propósito do artista envolve os aspectos mais elevados da força criativa emergindo vitoriosos sobre seus aspectos inferiores. O que vemos da força da vida e seus caminhos muitas vezes podem parecer detestáveis, mas a força criativa que amamos representa as partes ocultas da força da vida, que nos foi dado o poder para cultivar. Isso foi colocado em nossas mãos para tirarmos uma flor da sujeira.
Texto original: johnfrusciante.com/2013/01/16/the-creative-act/
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